O DIABO TAMBÉM É FILHO DE DEUS
Apologia
cristã ao Satanás.
I
e Único ATO
Esta obra é uma crônica
dramática sobre a necessidade que temos de achar um bode expiatório para tudo.
Existirá sempre um culpado maior para nos livrarmos de nossas culpas menores. A
maldade grande faz com que nossas pequenas maldades sejam insignificantes. Foi
por isso que o nosso Diabo saiu do inferno, cansando-se de seu funcionalismo
público. Decidiu que seria um mortal e que só voltaria para seu antigo emprego
caso reconhecessem sua importância para o equilíbrio do mundo. Atitude
louvável, no mínimo.
O Diabo, aqui, é um
sujeito pacato, aparentemente inofensivo, em função de seus trajes alinhados, a
camisa posta por dentro da calça e o cabelo milimetricamente penteado para o
lado. A única coisa que ostenta é um bigode bem alinhado. Não podemos descrevê-lo
fidedignamente, mas trata-se de algo situado entre o bigode de Hitler e o bigode
do Sarney:
Este pequeno homem se senta
rente ao balcão de um bar. Sem jeito, ele pede, no começo e ao longo da peça, várias
doses de conhaque, tomando-as e sentindo o álcool descer pelo esôfago como
chumbo fervente - se fosse o caso, soltaria fogo pelas ventas, mas isto não é
do seu feitio.
DIABO (Depois de ter tomado o primeiro gole de uma dose). Ave Maria! Como
isso é forte! É álcool puro! Fico imaginando a mente do infeliz que fez isso...
Não deixa de ser uma excelente invenção... Ao contrário da ciência, da metafísica
e da dialética, o álcool une, num só gole, significado e sentido, cura e
doença, causa e finalidade... Saúde! (Mais
um gole. Pausa) Estou cansado! Mas isso é bom. O cansaço físico, diante da temporada
de marasmo e desgosto pela qual passei, é um prêmio... um prêmio incondicional...
(Mais uma dose) Ai, que inferno! (tapa a boca com a mão, censurando-se) É
melhor que eu me cale... Aqui, nestas bandas de cá, não é bom dar muito na
vista... Tem muito malandro... Além disso, estas mulheres... estas mulheres,
podem levar um homem, com um simples laço de perna, para qualquer buraco. São
meninas formidáveis... De sorriso fácil... Sincero mediante pagamento. (Mais um grande gole. O copo esvazia. Ele se
exalta) Hoje chego ao fim de minhas forças, depois daí, nenhum passo a
mais, nenhum passo a menos! Não volto mais para aquele inferno! Nunca mais!
Greve! Bebam! Bebam, pobres humanos! Hoje não haverá mais nenhum castigo!
VOZ DE FORA DA CENA (abrupta e coerciva). TE
SENTA AÍ, SEU CORNO! PARA DE FALAR BESTEIRA!
O Diabo trata de se sentar
rapidamente. Com vergonha e frustrado, afunda a cabeça no pescoço o máximo que
a anatomia oblíqua das clavículas permite.
DIABO. Se fosse possível ao menos um reconhecimento... Mas ninguém se importa... O
mundo gira da mesma forma que um cachorro se dana a correr atrás do próprio
rabo. (Olhando a pista de dança) Olha
aí! Tudo continua na mesma cadência. A música que todos sabem cantar, aqui
acolá, a risada alta de uma mulher. Diferente é quando algum copo cai no chão e
quebra. Passado o fato, juntado os cacos, pede-se outro copo e tudo volta a girar! Arrocha!
Arrocha! Mas existe uma exceção: quando tem briga! Quando tem briga, tem gente
correndo, garrafa quebrando, mulher gritando de tudo quanto é canto. Não se
ouve o som do teclado e a voz afunilada do cantor. É um alvoroço. Mas, depois, aparta-se a
briga... Alguns segundos de silêncio... Escuta-se os primeiros acordes daquela
música conhecida, alguém se propõe a dançar e daí... A vida continua! E isso...
Isso é lindo! (Ele faz o gesto de quem
quer mais uma dose, mas não encontra resposta) Nada mais precioso do que a
ignorância. Dom, aliás, concedido apenas aos dotados de extremo bom senso ou
para os autênticos idiotas. Neste
momento, ignoro. Está tudo consumado! O que resta é o que está no fundo do
copo! Eu lavo minhas mãos! (Para a
garçonete) Oh, minha filha! Uma dose, por favor! (Ela finge que não vê) A parte ruim de ser o mortal é ser tratado
como um... Ninguém sabe quem eu sou... É certo que tenho meus fãs, mas nada proporcional
ao que represento para humanidade... Eu? Eu a sustento! Mas agora renego tudo...
Neste instante, minha recompensa é outra.
Quero apenas a liberdade de um simples bêbado – deturpada, obviamente,
mas infinita quando não tenho mais a responsabilidade que me foi, injustamente,
vale ressaltar, injustamente imputada! (Para
a garçonete) Uma dose, minha filha, por favor, pelo amor de Deus! Eu quero
brindar este gesto magnífico: a minha saída das caldeiras do inferno! Minha
recusa da eternidade! (A dose chega) Finalmente!
Finalmente, minha filha! Não existe nada melhor do que ser um diabo anônimo!
Uma luz vermelha
sai do balcão, como se abrissem uma janela que desse para inferno. Uma pequena
pausa se instaura. Mas logo é deposta por uma voz estridente que saí de fora da
cena
VOZ ESTRIDENTE. Ô,
Reginaldo! Oh Reginaldo, meu filho! Acendeu a luz vermelha?
VOZ DO REGINALDO. Coloquei,
sim senhora! Não precisa gritar não... (resmungando) Parece que nasceu de sete
meses...
VOZ ESTRIDENTE. O quê,
Reginaldo!
VOZ DO REGINALDO. Nada
não, nada não!
VOZ ESTRIDENTE. (Anunciando na caixa de som) Com vocês,
vinda diretamente do Pará, ela, que faz cachorro tomar água no copo, Suleika
Saleitcha! A strippe! Aplauso, gente!
Aplauso!
Surge a formosa Suleika cujas ancas
transbordam da roupa apertada. Ela faz o strippe. Pedindo, no final, que o já
apresentado Diabo ponha dinheiro em sua calçinha. Obviamente ele põe, pois não
é nenhum santo. A apresentação acaba. Ela sai. Pausa.
DIABO.
Na época, no começo de tudo, eu era ingênuo... Aceitei de bom grado, a tarefa
de ser o representante de todo o Mal. Não percebia, inocente, que caía numa
grande armadilha. O homem não tinha ainda sido inventado. Assumi o cargo. Era
um trabalho muito tranquilo. Na verdade, ficava a maior parte do tempo sem
fazer absolutamente nada. (Ele pede uma
dose. Mas ela não vem) Quando chegaram os primeiros humanos a situação
melhorou um pouco. O que era teoria virou prática. Castigá-los era um prazer imenso,
confesso. Sentia-me uma espécie de justiceiro. Trabalhava com este afã. Todo
tempo feliz, com a sensação pura do dever cumprido... Ora veja... (Alterado. Para a garçonete) Minha filha!
Garçom! Uma dose! Por favor!
GARÇONETE.
Já vai...
DIABO.
Já era para ter vindo...
GARÇONETE.
Se quiser pode esperar em outro bar...
DIABO.
Estou muito bem aqui, obrigado... (Para o
público) Sinceramente, às vezes penso que não estou pagando o que compro...
Mas voltemos ao assunto... Com o tempo, já um pouco exaurido, olhava o inferno lotar
muito rapidamente. Era muita gente para ser castigada. Filas enormes de almas
pecadoras. A situação era tão vexatória que alguns infelizes achavam que a
própria fila já era o próprio castigo. Quando eram informados que não, reclamavam
do atendimento, falavam em processo. Em processar-me, acredita? Houve uns dois
ou três que me chamaram de incompetente... “Incompetente”, pode uma coisa dessa?!...
(Para garçonete) E minha dose, não
chega?
GARÇONETE.
Já vai, caralho!
DIABO.
Nessa história de já vai, nada vem...
GARÇONETE.
O que você disse?
DIABO.
Nada! Nada! Estou falando com o público... Desculpe...
GARÇONETE.
Ah bom...
DIABO. Se tem uma coisa que não gosto é de
serviço mal feito!
GARÇONETE.
O que você disse?
DIABO.
Nada, já disse...
GARÇONETE.
“Já disse” o quê?
DIABO.
Já disse nada...
GARÇONETE.
Ah bom...
A Garçonete sai de cena
DIABO
– Onde estava? Ah sim! Certa
vez, dando uma volta para espairecer, ouvi alguns cochichos... Falavam do
paraíso, da bondade, e alguma coisa a respeito de virgens. Quando cheguei, o
assunto acabou. Ficou uma atmosfera rançosa, um clima pesado, sabe? ... Confesso
que fiquei um pouco constrangido. Algumas pessoas, quando se dão conta de que a
morte não acontece mais e que não há sofrimento no universo que não seja
suportável, perdem a noção de hierarquia, tornam-se ousadas... Certo dia, uma dessas almas perdidas se tornou
para mim e disse: “Tudo isso é culpa sua!”.
Chega um bêbado.
Ele tem uma garrafa nos braços. Olha o Diabo, estranhando-o em função de seus
trajes. Mede-o indiscretamente, da cabeça aos pés.
BÊBADO
(para a garçonete). Uma dose pra mim,
porra!
Imediatamente é
servida uma dose. O Diabo fica notadamente perplexo.
DIABO. Mas isso é uma
falta de respeito! (Para a garçonete)
Ei! Ei! Eu exijo minha dose! Agora!
BÊBADO. Ihhh... Tá nervosinho esse aí...
DIABO (irritado). O senhor está direcionando
a palavra a minha pessoa?
BÊBADO. Eu, não... (A parte) Esse aí...
Huuuummm... Não sei, não...
DIABO. Eu estou ouvindo senhor!
BÊBADO (A parte). É... Pelos menos não é surdo...
DIABO. Ainda estou ouvindo! O senhor faz idéia de quem eu sou? O senhor tem noção?
BÊBADO. Tenho eu não...
DIABO. Pois o senhor fique sabendo que eu...Fique sabendo que eu sou o Diabo!
BÊBADO
(assustado). O quê?
DIABO. O diabo!
BÊBADO. O que, rapaz?
DIABO. O DI-A-BO!
BÊBADO (rindo e zombando). E é o Diabo, é? É
mesmo?
DIABO. Sim, em pessoa! ...
BÊBADO. (parando de repente de bater a cabeça
contra o balcão. Sentindo a dor das pancadas) Ai! ... E depois a mulher
fala que eu bebo muito... Ai, minha cabeça... Viu? Tudo culpa sua!
DIABO
- Como pode tudo ser culpa minha? A culpa de toda maldade, de tudo que é ruim não
é minha! Quem foi que disse que a culpa é minha? Quem foi? Eu não faço absolutamente nada a não ser
acolher os desviados. Tudo funciona como uma engrenagem, um grande organismo,
no qual tudo está interligado. Esse era o combinado. Eu me lembro muito bem. Eu
não sou doido.
BÊBADO - Pelo visto...
DIABO
- Como posso ser eu o grande vilão, se faço apenas o meu papel? Como? ...
BÊBADO
– Mais uma dose, ô vagabunda!
Dose é servida imediatamente. O bêbado
vira tudo em um só gole.
DIABO - Como pode eu...
BÊBADO – Ô garçonete chupa
cabra! Mais uma dose! Rápido que eu não estou com pressa!
Dose é servida imediatamente. O bêbado
vira tudo em um só gole.
DIABO
– (cutucando o bêbado) Como pode eu
ser tudo que não...
O bêbado cai com a cabeça no balcão e
dorme...
DIABO – Ei! Ei! Que merda!
Ninguém me escuta! Oh minha filha, por favor, uma dose...
GARÇONETE – Já, já...
DIABO
– Ela não sabe o que é castigo, essa jovem...
GARÇONETE
– O que o senhor disse?
DIABO
– Nada não... Estou falando aqui com meu amigo...
GARÇONETE
– Ah bom...
DIABO
– (Para o público) Pense no inferno
como ‘o que não vai para o paraíso’. Ficou melhor a nomenclatura, não é? Dividem-se
as responsabilidades. Distribui-se os méritos. No entanto não é viável. É
difícil de decorar. É melhor do jeito que está. Tudo será chamado de inferno. A
morada do Satã. Origem de tudo que não presta e é digno de desprezo. Esplendido!
Muito mais didático! Todavia, injusto! Eu me lembro que passava nos locais onde
as almas eram supliciadas, conferindo para ver se tudo estava direitinho...
Notava aquele olhar de temor. Sentia o respeito empunhado pela minha figura.
Percebia que tudo parava por alguns segundos. “Sim. Eu cheguei. Eu sou o dono
de tudo isso aqui. Eu sou o general do inferno!”. O respeito inflava meu peito,
mas não era respeito tudo aquilo. Era raiva. Inconformismo. Era despeito e até
inveja.
VOZES
ZOMBETEIRAS FORA DA CENA.
“Olha
lá! O culpado de toda nossa tragédia!”
“Olha lá aquele que não tendo nada para fazer
dignou-se a criar a maldade”, “Eis o ‘coisa ruim’! Se não fosse ele, estaríamos
no céu!”
“Onde
será que ele esconde o rabo e chifre e o tridente? Ainda por cima é um farsante!”.
DIABO
(Revoltado). Pode um negócio desses? Pode? Isso me deixa... isso me deixa...
Isso me deixa emputecido! (para a
garçonete sob o efeito do transporte de raiva) Me dá uma dose! Oh garçonete
de merda! Sua puta! Filha de uma rapariga sem dente! Escrota! Infeliz! Filha da
puta! Sua porra! Seu caralho! Sua iconoclasta!
A Garçonete entra e
dá um tapa no Diabo
GARÇONETE. Olha, eu posso ser uma merda. Minha mãe era puta e, além de puta também era banguela
e ainda hoje tá no ofício. Porra e caralho fazem parte do meu métier. Sou puta mesmo e com orgulho. Mas
Icono... Iconaca... Iconocu a mãe de quem mesmo, minino?
DIABO. Iconoclasta.
Outro tapa.
GARÇONETE. Iconoclasta eu não sou! Viu? Ora porra! Só me faltava essa (se retira resmungando)
Silêncio
DIABO. E a dose nunca vem... É possível a vida de um homem se resumir à espera de
uma simples dose? É frustrante. Tenha absoluta certeza. Eu sempre fui uma
marionete, manipulada por essa necessidade humana, pior do que aquela de sempre
encontrar aquele que se sacrifique, assim a salvando, libertando-a, pagando por
seus erros, garantido a vida nova e o perdão; pior do que isso é a necessidade
de sempre encontrar um culpado para tudo. Aquele que é mau por essência. Aquele
que subjuga e que não tem menor piedade. Esse sim, apesar da maldade
exacerbada, garante que o povo esqueça que tem uma marcante nesga de
malevolência. Que também é mau. É ruim. Esquarteja. Pendura os pedaços e come
fígado. Essa sociedade perversa que caminha pisoteando os que caem. Que ignora
a miséria alheia, quando se edifica um bem-estar. É disso que eles esquecem
quando há um culpado. Quando há um ditador. Um assassino. Quando há um diabo!
Depois daquele, nada pode ser pior. Diante do que aquele representa, do que
aquele fez, do que aquele obliterou, nós... nós somos santos! E a vida
continua... E o diabo? O Diabo não sai do lugar. Mas não vou me deixar abater
por isso... De certa forma, inconsciente, já tinha noção do que era o homem e, depois
do homem, o que é a sociedade. No entanto, me deixa indignado o fato de não
haver reconhecimento. Não me dedicam um estudo, não me dão uma importância,
exceto a de ser o epicentro da maldade, sem nenhum estudo de caso, tudo
afirmado categoricamente, arbitrariamente, apenas para retificar que não existe
nada pior do que o capeta! Acredite, há bem mais do que isso! Mas, ao que
parece, o inferno não carece de refutação.
Entra um homem suspeito em cena.
Desconfiado, olha de um lado para o outro. É um assaltante. Mas isso, por
enquanto, fica em segredo entre a eu e você, deixemos o Diabo falar.
DIABO.
Existem estudos, debates calorosos, salivas expelidas em pleno discurso,
falando sobre a existência ou não de um senhor para tudo que existe. Há quem se
professe ateu, por não acreditar na autoridade divina. Mas não há quem e, por
isso, não há nomenclatura e conceito, que suponha a existência ou
não-existência deste humilde Diabo que vos fala. E não se perguntam que, se
talvez eu não existisse, o paraíso seria uma coisa sem graça, sem dialética.
Não percebem a minha importância para o todo e para tudo, e que a pocilga do
inferno é a infra-estrutura do firmamento. Digam-me. Sinceramente. É justo?
ASSALTANTE. (cutucando o Diabo) Ei!... (O Diabo não responde. Cutucando com mais
ênfase) Ei!...
DIABO. O que foi?...
ASSALTANTE. Me dá um real, moço?
DIABO. Meu amigo, eu não tenho nenhum trocado...
ASSALTANTE. Pode ser inteiro, então! Não tem problema...
DIABO. Eu falo a verdade. Eu não tenho nadinha, aqui.
ASSALTANTE. Oh meu patrão... ‘Meno’ um real pra inteirar ali num prato de comida. Não comi
nadinha hoje. ‘Meno’ um real, aí...
DIABO. Tem não, tem não...
ASSALTANTE. Ei, siô, me arranja ‘meno’ um real, aí, um real, aí, pra inteirar ali pro
leite das crianças... Os ‘menino’ tão tudo sequinho, só o senhor vendo,
sequinho, sequinho... Me dá um real...
DIABO. Oh, meu amigo, é por que não tem mesmo...
ASSALTANTE. Ei, meu chegado, me descola aí ‘meno’ um real pra
inteirar numa garrafa de cachaça ali, ‘rapidão’. Não vou mentir. Não é? Um
real, aí? Faz esse favor, aí, pro seu chegado...
DIABO (um pouco irritado). Eu não tenho,
não, rapaz... Já te disse...
ASSALTANTE (puxando um pequeno revolver). Então
passa o dinheiro que isso aqui é um assalto! Te liga! Passa logo o dinheiro!
Não dá esparro, se não eu te dou um pipoco!
DIABO. O quê?
ASSALTANTE (se irritando). Tá surdo, meu irmão!
É um assalto! Passa dinheiro! Vou te dá um pipoco! Já mandei uns três pro inferno,
e não me custa mandar o terceiro!
DIABO. O quarto... Se você já matou três, eu
seria o quarto.
ASSALTANTE (fazendo as contas mentalmente). Primeiro,
segundo... (fica pensando)
DIABO. Terceiro...
ASSALTANTE. Quarto... É verdade, faz sentido. (Mudando
de tom) Mas não interessa! Perdeu! Perdeu! Perdeu! Vai passando tudo! ‘Vumbora’!
‘Vumbora’! Passa tudo!
DIABO. Tá bom! Tá bom! Eu dou... Eu dou... Só não atira, por favor!
ASSALTANTE (pegando o dinheiro), Hummm... Agora,
sim...
O Assaltante se
retira.
Fora da cena.
Ouve-se a voz dele. Anunciando um assalto. Dando tiro pro alto. Há uma gritaria
geral. Cadeira caindo. Garrafa quebrando. A Garçonete aparece na cena,
desesperada.
GARÇONETE.
Corram! Corram! Zeca Pedro Diabo, tá solto! Vai matar todo mundo! Ele é ruim!
Ele é mau! Corram! Corram todos! Aí, meu Deus! Aí meu, Deus!
Ela se retira. O
Diabo não sai do lugar. Apenas se abaixa um pouco, protegendo-se. Ele é o único
que fica no recinto. Desconfiado e certificando-se de quem ninguém o olha, ele
pega uma garrafa que está atrás do balcão.
DIABO (Relaxando). Só assim um homem pode
ter um pouco de sossego... Estou de férias! Férias! Há quanto tempo queria dizer isto, mas a
eternidade não deixava. Aposento-me! De agora em diante, serei humano, com vida
e prazo de validade. Se morrer o máximo que pode acontecer é voltar para o inferno
onde já conheço toda a burocracia. Mas, mesmo assim, não me encarregarei do trabalho
sujo! Não! Não! Isso nunca mais! Quero paz! Pode parecer irônico, mas eu, o Diabo,
também sou filho de Deus!
FIM
Igor Nascimento
06/10/2010
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