Caderno de Direção #8
Estamos
perto do fim do ano e fechamos esta temporada de Um dedo por um Dente com 14 apresentações por nossa conta, 2 pagas
pelo Sesc e um total de R$ 89 resultante das passagens de chapéu no final do
espetáculo... Operando a mesa de luz tirei algumas
conclusões. Aí seguem:
Conclusão
nº
1
São muitas as pessoas
que fazem teatro no Maranhão, mas são poucas as que o discutem. O que ainda me choca são alguns grupos que
viajam, tem a chance de fazê-lo, mas voltam sem dizer nada, sem publicar os
resultados, compartilhar o processo, as dificuldades. Nesse ponto admiro a
Pequena Cia de Teatro. Eles viajam pelo Brasil, publicam como foi o espetáculo,
a recepção, o que se pode fazer para melhorar, como eles chegaram a tal produto
etc. Se vão para um estado não dizem “olha a Pequena no Pará!” ou “Tal lugar é
maravilhoso”. O que adianta saber de tal companhia foi para tal região se eu não posso
ir lá assisti-la? O que vale é o relato daquela experiência compartilhado, dialogado
e trabalhado. O facebook e os blogs são ferramentas fundamentais para isso,
embora, em tais redes, me pareça que um “curtir” valha mais do que mil
palavras. Mas postemos! Um dia se cansam e lêem, um dia lêem e comentam!
Conclusão
nº
2
São Luís tem dois tipos
de público que, no final das contas, dão no mesmo. O dito “povão” que não perde
tempo com teatro, pois o pagode está fervendo e cerveja congelando. E o outro:
os ditos “intelectuais”. São cultos, é claro. Falam bem do que bom e mal do que
é ruim. Isolam-se em suas rodas de conversa na paisagem de um bar, fazem textos
para eles mesmos, publicam livros para os seus e cultivam o que chamo de “público
familiar”, ali poucos entram, dali, dificilmente algo sai. Para mim, ser
intelectual é uma ofensa. Na era em que precisamos de homens de ação, o
intelectual é a figura mais inútil no meio desta briga. Sou pensador. Meu trabalho é pensar para achar
soluções e não procurar soluções para pensar. O que precisamos é de inteligência, não de
intelectualismo.
Conclusão
nº
3
A amizade é como ferro.
Se nada acontece entre as pessoas, se elas não passam poucas e boas juntos,
esta matéria não sofre reações e não se solda. Eis a diferença entre amizade e
a convivência. A última enferruja, a primeira se funde, se interliga,
justamente para evitar este salitro que é a superficialidade das relações. Com
Nuno e Luís passei maus e bons bocados. Fomos da frustração à glória. Provamos
da decepção e da apoteose. Apreendemos juntos. Progredimos. Investimos...
Um
dedo por um dente foi uma escola. Personagens que não
existem no mundo real. Cenário com luz de jardim que leva 5 horas para montar e
que levou três meses para ser feito. Pagamos para fazer teatro, isto é um fato.
Mas neste ponto acho importante fazer uma ressalva:
O cara quer fazer um curso (superior ou
técnico) ele o paga, mesmo se não pagar, deve freqüentar todas as aulas para
obter o certificado. Por que o teatro não obedeceria à mesma lógica? É preciso melhorar
o trabalho, apreender com os erros, fortificar o jogo, ser criativo, escrever,
reescrever, botar em cena, tirar de cena, concertar, fazer uma extensão, gastar
tempo, trabalhar como uma besta e estudar como um típico concurseiro... Em
minha opinião tudo deveria ser tratado da mesma maneira: o estudante de
engenharia que negligencia os estudos e não se aplica pode derrubar um prédio
por um simples erro. A companhia que não trabalha com afinco e aprimora o seu
trabalho (independente dos recursos) pode chafurdar a magia do palco e destruir
a possibilidade de construir um sonho.
Conclusão
nº
4
Se todo este trabalho
nos custou caro é por que, com certeza, não sairá barato.
Conclusão
nº
5
Em função dos inúmeros
testes que fizemos, de abrir a peça para o improviso, pervertendo o seu
significando, fechando a peça novamente, abrindo-a para a intensificação de
ritmo e energia de cena, de nos apresentar para diferentes públicos (crianças -
diabólicas por serem anjos; anjos por serem diabólicas - moradores de
periferia, estudantes da universidade, intelectuais, pensadores, um fotógrafo)
tivemos a chance de aplicar vários métodos e ver o que funciona e não funciona.
Conclusão
nº
6
Os sentimentos mudam a
decorrer de cada experiência. Antes de apresentar ficava tenso e ansioso, agora
fico nervosamente tranquilo. Quando o espetáculo não dava público ficava
decepcionado, agora fico apenas triste, uma tristeza que é mais fruto de uma
constatação (conclusão nº 2) do que de uma expectativa posta em xeque (mate).
Conclusão
nº
7
Após este longo artigo,
espero que nos acompanhem na nova empreitada da Petite Mort: DONA DERRISÃO. Uma
peça que tem como tema o Alzheimer, completando o ciclo do projeto “Diálogos
com o Absurdo”, que começa com Um Dedo
por um dente, passa por Dona Derrisão
e desemboca em Esperando Godot.
seu moço, sua angústia é maior do que o necessário para produzir e ser escravo liberto do teatro. acredito que o processo de vocês é delicado, pois fortalece o fazer na porrada. é delicado porque exige a perfeição mesmo no improviso. não contabilizo os imprevistos. o clima sempre muda. gosto do "um dedo...". quero revê-los em breve.
ResponderExcluirCom Certeza, Cláudio! Não vamos matar esta peça. Ano que vem iremos continuar nos apresentando. A peça ainda não está concluída, no teatro não há conclusões. Há aberturas. Abraço! É bom (l)(v)ê-lo por aqui
ExcluirBoas e importantes conclusões Igor. Falar do processo é muito importante e corajoso, acredito também que a troca entre as Cias é essencial. Somos muito frágeis ainda para achar que podemos ir sozinhos. Acontece que sozinhos andamos muito pouco, estamos é fazendo buracos de tanto pisar no mesmo lugar. Boa estrada com o projeto novo.
ResponderExcluirQuem está andando para frente, mesmo que tropece, dificilmente tropeçará para trás. As quedas são dialéticas, são sinais que temos que mudar o ritmo do passo e olhar com mais atenção o caminho, mas nunca parar. Rumo à Beckett!
ExcluirAbraço!
A conlclusão nº 2, por si só, fez valer a pena a leitura desse artigo. Você toca em pontos delicados com muita ousadia. Aliás, o DEDO POR UM DENTE - que eu já vi duas vezes e adoro - é um trabalho delicado e ousado. Falei sobre isso com Luís, e por muitas razões. Depois compartilho com vc.
ResponderExcluirAbraços, Igor! :)
É ruim usar de ousadia para falar de algo tão claro e simples como o fluxo de público e produção em são luís, quando isso deveria ser um diálogo aberto e objetivo. O problema do público familiar é que qualquer coisa dita contra vira caso de família.
ExcluirAbraço!
P.S.: Onde se lê "conlclusão" leia-se "conclusão". hahahaha
ResponderExcluirE muita luz no trabalho novo! Que Odin abençoe! Haha Meerda!