Chove. Criou-se uma camada densa de água.
Por essa cortina de pingos os carros passam, perfurando. Os automóveis são
linhas estilizadas em uma lataria, à qual dão quatro rodas e um motor. Cada um tem um design diferente. Alguns modelos se repetem. Mudando o motorista,
vários carros são o mesmo carro, tais quais os peixes: mas, em vez de marcas,
os classificamos por meio de espécimes: sardinha, dourado, bagre, tubarão...
Eles andam em corrente de água, assim como os veículos andam em pistas. Existem
vários tipos de pista: em asfalto, pedra, areia etc. Existem, também, vários
tipos de cursos de água, rio, mar, córrego. Mesmo quando parados, peixes e
carros, assemelham-se. Aquariado no estacionamento, os carros têm a mesma cara
de tristeza de um peixe estacionado em um aquário: parados eles miram para
lugar algum, prontos para, a qualquer momento, partir – embora sem podê-lo. Isso porque
ambos tem olhos que nunca fecham. Dormem prontos para se locomover ao mínimo
sinal. Sempre estão apontados para frente - o que acontece por não poderem
dobrar seu corpo para se sentar. Ainda não é definido pela ciência se os peixes
estão deitados ou em pé. Da mesma forma, esse detalhe não está especificado nos
manuais automobilísticos. Isso faz com que tenham existência de setas e sejam
responsáveis pela direção. Quando não há carros na rua, não há quase movimento
na cidade. Quando tem muito carro diante de um local, é porque há muita gente
lá dentro. Na água, peixe em grande quantidade é sinal de vida. No Mar Morto
não há peixe, devido à grande quantidade de sal – daí ter sido batizado
defunto. Se peixes conduzissem carros, no lugar das pessoas, certamente não
haveria mais acidentes. Pois aquele que foi projetado para o nado, certamente
saberia rodar no asfalto, deslizando. Não há colisão de trânsito no mar ou no
rio. Mesmo quando sardinhas se engarrafam, fazendo um cardume, elas não se
colidem. Ambos, carros e peixes, têm o fluxo do espaço contido no próprio corpo
e, provavelmente, se entenderiam muito bem. Se, porém, os homens fossem peixes,
eles criariam aviões para nadar no ar dentro de bolhas.
Peças, Roteiros, Hibridez, Prosas, Poesia, Críticas - TEXTURAS SOBRE TELA
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hahahaha! Isso me lembrou demais um diálogo de um filme, que contava que as pessoas de nova york viviam jogando guimbas de cigarro no chão e iam para o mar, e que os peixes ficavam dependentes da nicotina.. mas infelizmente não tinham bolsos para colocar seus isqueiros! Massa, esse encontro entre carros e peixes.
ResponderExcluirValeu Gabi!!
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